quinta-feira, dezembro 18, 2008

Fim de etapas... vazio, insegurança ou potencialidade criativa?

É sempre assim. No momento em que alcançamos um objetivo desejado, mesmo que seja apenas temporalmente distante, a satisfação embebeda nossa capacidade de compreensão. Em seguida... vazio. Sentimos a falta do desafio, do hábito, da rotina, da vivência...


Encerrado um ciclo, o maior desafio que se impõe é percebermos tal conclusão e, o mais rápido possível, canalizar a nossa energia e dedicação para as outras coisas que insistem em caminhar nas nossas vidas.


Sem tal canalização: são 15 e 30 e ainda estou de pijama! Tédio, nó no peito e, dependendo das condições também biológicas de cada um, depressão. Fácil falar, pensar... mais complicado agir.


A partir da atual carência de complexidade das relações humanas que cada vez mais se dissipam em ambientes ciber, lan, bits, bytes, hi-tec, se percebe um agravamento da situação. O vazio é cada vez maior. Se cai a nossa rede, então... catástrofe, Armagedom.


Hoje os vizinhos não se cumprimentam no elevador, mas ficam horas “conversando” nos eme esse enes da vida. Curioso isso? Não. Perfeitamente explicável na cada vez mais presente atomização do sujeito e na ausência de uma identidade única, hoje “concretizável” por avatares que caminham, comem, conversam e, até, fazem sexo.


Como superar o vazio? Não sei. Incremente relações sociais. Substitua o virtual pelo real, muito embora a realidade do virtual seja muito mais sincera do que a do real – até porque ele se desvaloriza cada vez mais, a cada dia.



quinta-feira, novembro 20, 2008

Namoro na praça ou De hábitos de cidade pequena.

Ainda era agosto, o ar frio do inverno não era apenas uma lembrança. Pelo contrário, exigia, ao menos, uma camada de lã. Encontrei um de meus colegas de escritório no saguão do nosso prédio. Ele olhava para a praça em frente.

Ao me ver, comentou: - Curioso esse hábito de certas pessoas namorarem nos bancos da praça. Parece que esquecem do mundo e só eles estão ali. Lembra o passado ou a tradição antiga do flerte no ponto de encontro das pequenas cidades!

Parei, olhei, dei razão a ele e subi para mergulhar na minha atividade profissional, sem me preocupar com tal flagra do cotidiano.

No sábado pela manhã, daquela mesma semana, precisei ir ao escritório. Estacionei o carro em frente à praça e percebi um casal.

Ele, aparentando uns sessenta e alguns, ela, uns cinqüenta e vários.

O agasalho desbotado dele e a sandália grosseira dela denunciavam a simplicidade da ambos.
Enquanto ele falava e gesticulava ela simbolizava todo o carinho e afeição em um gesto simples de organizar a franja grisalha e aparentemente macia do amado.

Olhavam-se como se mais nada houvesse em volta. Questionei-me se era a história narrada por ele entretia-os completamente, ou seria o sentimento nutrido por ambos que os faziam assim?
Risos, gestos, olhares... expressões...

Subitamente ele para de falar e ambos voltam seus olhares para o assento do banco onde estão. Ali, um celular.

Como o "filme" real que eu assisitia de dentro do meu carro não tinha trilha sonora, deduzi que o aparelho estava tocando... tiruriru tiruriruriiiii...

Ele pega o telefone e ela interrompe o gesto de anteder com um carinho na mão. Olham-se... Ele sorri... aperta um botão, larga o incômodo e continua a contar-lhe sua história...

Segue o meu dia e penso: - quem me dera pudesse ouvir todas as histórias que aqueles bancos da velha praça têm para contar.

quinta-feira, setembro 18, 2008

A agonia de Bernardo ou Para algum amigo

Bernardo acreditava em um mundo sem regras rígidas. Tanto em relação ao trabalho quanto nas questões afetivas. Era ideologicamente contrário a tais predisposições que buscavam, segundo ele, domar o animal que cochila em cada um de nós.

O problema surgia quando se envolvia emocionalmente com alguém. Era difícil. Geralmente iniciava seus relacionamentos sem muita convicção, devagar, sem grandes demonstrações de afeto, discursando sobre a liberdade, sobre a busca permanente de prazer... ...até o dia em que percebia que a liberdade do outro era uma carga pesada e áspera demais para suportar.

Aí, sofria. Hipócrita? Não. Humano. Demasiado humano.

E então, começava a tortura: continuar, investir, afastar-se... E aí, sem perceber, ou secretamente notando, também impunha sofrimento. Palavra chata! Superada em sua amolação apenas pela imolação de suas convicções.

E assim vivia; sem entregar-se de verdade. Sempre deixando abertas saídas de incêndio para o seu coração. Rotas fáceis. Cômodas. Porém, destituídas de taquicardias e mãos suadas.

Nunca se perdera em meio ao dia a dia com pensamentos distantes em alguém. De certo modo, lamentava isso. Mas em verdade, gerava isso. Morria de medo de tal possibilidade, pois tal fuga de imagem significaria a renúncia às convicções de liberdade plena – tão lindas no papel e na fala, mas tão distantes do coração.

O auto-engano era ideológico, não sentimental. Sem a construção teórica seria mais fácil.

Um dia, rompeu com seus ideais. Assumiu-se como alguém possessivo, capaz de sofrer por alguém, ao mesmo tempo egoísta e sujeito a deprimir-se com um simples telefonema não atendido... Rompeu com seu discurso. Para alguns amigos, desmoralizou-se. Para si, finalmente, viveu!

quinta-feira, agosto 14, 2008

A invisibilidade do depois ou Do tempo perdido.

O ponteiro mudo do relógio corrompe segundo a segundo a castidade do próximo momento. O registro dos minutos é curto, pesado, preciso. As horas passam. O tempo, tal qual visualizado por Dali, derrete, se esvai, de certa forma, perde forma e sentido.

Enquanto assombrado com tal velocidade, Felício não percebe a distância entre o que deixa para depois e o que não realizou ontem. O depois é turvo, raro e passa sem ser visto.

E, por isso, guarda na gaveta aquilo que pensa deva ser enfrentado no dia seguinte. O amanhã passa e quando percebe, meses e anos se foram sem que tivesse enfrentado questões e concretizado planos. O silencioso e invisível “depois”.

Inimigo do concreto, forma na cabeça de Felício uma miragem de realização. Deixar para depois é negar a prática. Ignorar o enfrentamento, o estar atento, a solução.

Felício tenta se erguer e a artrose o impede de fazê-lo com pressa e sem dor. Seu corpo não acompanha mais o seu raciocínio e até quando este permanecerá intacto pela crueldade do tempo, não sabe. Dirige-se ao velho armário, abre a porta e, com dificuldade, coloca sobre a mesa a pilha de papéis, antes facilmente manuseada.

Passa a examinar os escritos e percebe anos e até décadas entre o que está ali e a data estampada no jornal de hoje. Vê rabiscos e anotações em folhas de cursos e escolas que não existem mais. Percebe o quão poderia ter evoluído em suas “distrações”, mas não o fez. Percebe-se o mesmo de 60 anos atrás em suas habilidades, agora, ainda por cima, debilitadas pelo caminhar incessante do relógio.

O alarme toca. Quinze horas, hora de se encaminhar para a consulta médica. Felício suspira lentamente, pega a pilha de papéis, recoloca no armário e fecha a porta. Deixa para o dia seguinte a análise mais detalhada dos papéis. E o tempo passa...

segunda-feira, junho 23, 2008

Intransigentes ou De quem nos move.

Quem tem consciência para ter coragem

Quem tem a força de saber que existe

E no centro da própria engrenagem

Inventa a contra-mola que resiste

Quem não vacila mesmo derrotado

Quem já perdido nunca desespera

E envolto em tempestade, decepado

Entre os dentes segura a primavera!


A música dos Secos & Molhados expressa um sentimento de continuidade na defesa intransigente daquilo que acreditamos. Segurar a primavera entre os dentes é mais do que um simples dever, uma condição humana daqueles que acreditam em cada palavra do que dizem. O melhor compromisso assumido para com as nossas consciências.

Não se trata de ser intransigente, mas de mantermos sempre a cabeça erguida, com o nosso orgulho intocável, não na concepção de sobreba, empáfia ou presunção, mas na de brio, altivez e amor-próprio. Amor por aquilo que somos e defendemos. Por não modificarmos o nosso discurso com a finalidade de sermos mais dóceis ou parecermos mais domesticáveis. O nosso orgulho nos impede de fingirmos ser o que não somos. De acenarmos com gostos ou predileções que não dispomos.

Sob a relíquia de tão caros sentimentos é que se amolda a "consciência [suficiente] para ter coragem"; encontra-se a força, não se vacila, não se entrega, simplesmente, se é. Existe.

Quem caminha nesse campo não perde. Nunca é derrotado, pois sempre traz consigo "a primavera" entre os dentes. A esperança da vitória, do florescer. A necessidade de luta. E assim, além destacar tais valores e mostrar sua força, move pessoas a caminharem juntos no mesmo sentido, não para simplesmente "vencer" - o que seria pueril e temporalmente identificável - mas, sim, para, na luta, permanecer cotidiana e permanentemente, revolucionando o espaço e desafiando aquilo que aí se pôs.

sexta-feira, junho 13, 2008

Opressão ou O preso

O último gole do café amargo combinava com o final do telefonema. Felício, sentado, olhava para a parede branca. Sentia-se oprimido. Duzentas atmosferas pressionavam seus ombros na direção do centro da terra. O que queriam dele era pesado. O peso arranhava sua garganta, seu estômago; tornava azedo o sabor de tudo o que provava na vida. Ou será que era insípido o que experimentava? Não sabia. Sentia, apenas, que sua visão não era mais tão larga, restringia-se a pontos fixos, sem a percepção do entorno, sem a compreensão do mundo.

Resolveu sair para caminhar. Era seu horário de almoço. Despediu-se rapidamente dos colegas da repartição onde desempenhava seu trabalho sem graça e saiu pela porta. Duas horas depois, nunca mais voltou.

Até hoje sua família e amigos buscam notícias de Felício. Boatos sobre ele são vários, mas nenhum que se possa dar real confiança. Ninguém sabe ou compreende como alguém que sempre parecera tão alegre e entusiasmado com a vida, simplesmente, anonimamente, sumiu...

Seus últimos relatos falavam da tal opressão. O que era tão grave? Perguntavam os amigos e a família, ele dizia que nada de específico. A vida se tornara pesada, o ar era chumbo, as trivialidades não arejavam sua existência com o perfume das flores, mas sim, permeavam com cheiro de enxofre seu olfato cotidiano.

O mais belo se tornara cinza, o mais alegre, ácido, o mais suave, em áspero. Nada mais lhe motivava. Buscava novas atividades como forma de espanar a rotina e ser reconquistado pela vida. Não adiantava, nada lhe satisfazia. Só de ouvir o seu telefone tocar, murchava, afundava em sua cadeira. Sentia sua garganta fechando. Vontade de chorar...

A verdade? Hoje se encontra em um lugar distante na América do Sul. Entre bicos, de tempos em tempos, consegue meios de subsistência. Seu celular não toca mais - aliás, deixara sobre sua mesa, no dia de sua fuga, talvez a sua mais brilhante decisão. Às vezes não tem dinheiro, em muitas sente frio... não freqüenta os lugares charmosos que tanto esteve e nem mesmo mais que cinco livros possui... porém, voltou a ver o sol brilhar, ao menos agora o percebe... ouve os pássaros cantarem, as suas noites são cobertas por estrelas que brilham sem parar... e, ainda, hoje ri, quando vê alguém agoniado, a correr sem parar, como se a querer carregar o mundo sobre os ombros...

sexta-feira, maio 16, 2008

Do fim da cordialidade ou Quando a educação deixa de ser virtude

Sempre ouvi dizer que a boa educação era uma virtude, um valor. O tempo passa e constato que fui iludido. Respeitar filas, vagas para deficientes, ser cortês e preocupar-se em não atrapalhar a vida alheia com o nosso egoísmo passaram a ser, apenas, formas de demonstração da nossa fragilidade enquanto seres humanos e conseqüente sinalização para que nossos direitos não sejam respeitados.

Há muito, em nosso país, a falta de consideração, a grosseria, a indelicadeza e a descortesia passaram a ser virtudes. Caso não o fossem, não haveria razão para aqueles que agem de tal forma serem privilegiados em relação aos débeis corteses.

Não, não estou equivocado. É assim em quase todos os lugares que freqüentamos: os “barraqueiros” que ofendem, humilham, gritam, furam a fila ou buzinam, têm o acolhimento de suas pretensões. Os educados, que demonstram o seu posicionamento ou descontentamento com educação e até, por vezes, doçura, são presenteados com a indiferença e com o não acolhimento de seus pleitos.

Diante de tal constatação, não há como negar que a boa educação deixou de ser virtude, até porque somente os atos virtuosos é que são presenteados. No caso, aquilo que nossos avós chamavam de má educação passou a ser uma forma de cada um expor a sua “virtude”, caso não o fosse, certamente seus pleitos não seriam atendidos.

Não há como compreender tais fatos de outra forma. Como se sabe, os valores sociais mudam com o passar do tempo e, tal qual o camaleão altera a sua coloração diante do ambiente em que se encontra, amoldam-se às novas formas de compreensão das relações humanas que se apresentam.

A velocidade, a pressa, enfim, o imediatismo da sociedade tecnológica do século XXI impõe novas compreensões e interpretações de fatos, talvez, até, a de que aquele que não age da forma dita pelos anciãos como educada não deva ter tanta necessidade de reconhecimento de seu direito. Ao menos, é a explicação pela qual compreendo tal fenômeno. Afinal, quem não se desespera com a perda de tempo, certamente, é um dinossauro na forma de mulher ou homem, mas nunca o “homo-tecno-sapiens” de nosso tempo.

Apesar de compreender tal fato, não me entrego. Ainda, nos pequenos momentos em que tenho de optar em privilegiar esta ou aquela pessoa no trato, não opto pela rudeza, mas sim, por aqueles que, mesmo na defesa de seus interesses olham o outro com respeito, com a mesma consideração que gostariam que fosse dispensada consigo.

terça-feira, maio 06, 2008

Do gozo da vitória ou da alegria de recomeçar


Indescritível é a sensação da vitória. O gozo causado pelo objetivo alcançado gera um prazer somente repetível quando novamente o alcançamos. É por isso que se busca sempre o sucesso. Só quem nunca sentiu tal sabor é que pode conviver com sua ausência, pois quem não se inebria não compreende o significado do poder do vinho.

Tal sensação é capaz de viciar e, quando nos sentimos derrotados, de fazer sofrer muito mais. A inaptidão para vencer nos poupa da frustração da derrota. Só quem já venceu sofre, de verdade, com a perda. Quem não vence não sabe o sabor que deixou de sentir. Benefícios da ignorância.

A vitória está estampada no sorriso de quem conquista. Não se descreve, frui-se, goza-se ou, apenas, se aplaude. Quem tem um sorriso estampado no rosto, quase que diariamente, é um vencedor nato e quem está por perto tem duas alternativas: ou se contagia, ou inveja.

A realização no trabalho, a classificação em um concurso, alcançar o resultado em uma competição ou, simplesmente, ver o seu time ser campeão, são sensações que, de certa forma, entorpecem e criam a necessidade de vivenciá-las novamente. Quem não sente tal necessidade, talvez, tenha perdido o prazer naquilo que faz. Neutralizou sua vida. Transformou-a em água – necessária para nos manter vivos, contudo, sem graça. Quem sabe não seja hora de mudar? Talvez, de recomeçar.

Recomeçar, aliás, tal qual a vitória, traz similar satisfação, aliada a um sentimento de nervosismo e de inquietação da incerteza do futuro que (ainda não) se apresenta. Nunca é tarde pra recomeçar, para tomar novos rumos, para sairmos da famosa sensação de conforto e desafiarmos, talvez até irresponsavelmente, os olhos incrédulos daqueles que nos miram com desconfiança.

A vontade de recomeçar traz significado comum ao da sensação de vitória, pois só quem desafia o mundo, rasga as regras e renasce, sabe o que significa trilhar um novo caminho.

segunda-feira, abril 21, 2008

Entre Isabella e a novela ou Pimenta nos olhos dos outros é colírio ou, ainda, Que curiosidade mórbida é essa que nos move?

(a partir de hoje, o blog volta a ter atualização semanal)

Renato Russo, goste-se dele ou não, tinha razão quando escreveu ‘Metrópole’:

- É sangue mesmo, não é mertiolate/ todos querem ver/ E comentar a novidade/ É tão emocionante um acidente de verdade/ Estão todos satisfeitos/ Com o sucesso do desastre/ Vai passar na televisão/ Vai passar na televisão...

Se no início dos anos oitenta era assim, quando a instantaneidade dos meios de comunicação ainda engatinhava, imagine-se no final da primeira década do século XXI. Nossas casas são invadidas, cada vez mais, pela graça da desgraça alheia.

Sob o mito do “dever de informar” se informa o drama que melhor vende, não mais se forma, só informa... deforma... disforme...

E o cotidiano nacional se transformou na sala de estar da casa dos Nardoni, uma família desgraçada por uma tragédia, sejam os adultos responsáveis ou não pelo cruel homicídio. Pouco importa. Sem perceber e muito menos se preocupar com isso, os meios de comunicação condenaram duas crianças a uma sanção perpétua... Cauã e Pietro, os filhos de Alexandre e Anna Carolina foram sentenciados pelo resto de suas vidas a serem os irmãos da menina morta ou, como provavelmente restará decidido pelo Tribunal do Júri, os filhos de um “casal de assassinos” – não se adentra aqui sequer na questão jurídica, já que, frente aos “laudos secretos publicados com exclusividade”, discordo da “solução” apresentada por “especialistas” de plantão.

Confesso que tentei fugir ao máximo do tema Isabella, mas não consegui. Mas tenho outro enfoque – aliás, em relação a um terceiro olhar, indico www.atristeutopia.blogspot.com, de Leonardo Mendes.

Até que ponto necessitamos do espetáculo na vida alheia para preenchermos o vazio das nossas? Pouco importa o quão triste seja o tema da trama, o que arde nos olhos alheios não nos preocupa, ou será que as lágrimas que caem de nossos não são uma forma de aliviarmos a nossa própria culpa? Ou, será que passaremos a noite em claro pensando em Isabella e na angústia dos familiares e, porque não, dos acusados? Certamente, ficaremos alguns dias sem comer.

Que vazio é esse que nos leva a encontrar sentido somente na conversa sobre a vida dos outros? É o mesmo vazio que faz do Big brother um campeão de ligações telefônicas. A “novela das oito”, independentemente do horário, deixou de ser imbatível, pois a distração, o entretenimento, passou a ser mais interessante se os fatos são reais, pouco importando quão perniciosa tal exposição possa ser para os envolvidos.

As vidas carecem de sentido, de densidade, de conteúdo... fala-se sobre gente, só isso... a People oferece 8 milhões de dólares para ter exclusividade nas primeiras fotos dos gêmeos (provavelmente lindos) do casal Jolie/Pitt. Faturarão quatro vezes isso em vendagem de revistas com tal chamariz.

A idéias desfalecem em um mundo de personagens em que não se busca mais o conteúdo. Quem não sabe de quem é este ou aquele rosto famoso – do desgraçado ou do iluminado pela fama – não pertence à “realidade”: - em que mundo você vive?

Outros momentos da história assistiram a perda do conteúdo, melhor definido como valor (Roma foi um valor), mas não por muito tempo. Não, não estou falando do preço de capa...

terça-feira, março 11, 2008

Vigiados e torturados ou triste verdade.

Duas informações do último final de semana chamaram a atenção daqueles que defendem as liberdades civis ou, simplesmente, que acreditam na dignidade humana a partir de alguns primados trazidos pelos holofotes do iluminismo. De volta às trevas lê-se que, como apurado pela Comissão Parlamentar de Inquérito referente ao grampo telefônico, em 2007, quatrocentos e nove mil (409.000) telefones celulares foram grampeados com autorização do Poder Judiciário; a outra notícia é que, segundo pesquisa do Ibope, vinte e seis por cento (26%) dos brasileiros apóiam a realização de práticas de tortura de suspeitos nas investigações criminais. Provavelmente, o grampo telefônico estatal, se questionado por meio de pesquisa, teria quantidade similar de simpatizantes.

(silêncio para refletir, ou tentar interpretar tais dados)

Entre os entrevistados que apóiam a prática inquisitiva, tida na idade média como o meio mais eficaz para se alcançar a confissão “espontânea” do herege, estão os que possuem maior renda e maior escolaridade (40% dos que possuem curso superior) – ou seja, a sempre lembrada “ignorância” não justifica o resultado. Ou seria a própria “ignorância” que o justifica? Ignorância que divide a sociedade entre homens de bem e outros não tão bem assim; que ensimesmada solidifica um enredado discurso de “nós” e “eles”; que tão bem pugna por medidas violentas contra a violência, até o momento em que tal violência se vira contra ela e, aí sim, torna-se abuso e truculência...

Ao mesmo tempo, descobre-se que o democrático Estado brasileiro, por suas instituições, aproxima-se do “Grande Irmão” da novela de George Orwell (1984). São cerca de 1.120 (mil cento e vinte) determinações judiciais de escutas telefônicas por dia! Algo deveras distante do que se denominaria de inteligência policial.

Levando-se em consideração que estes 409.000 telefones judicialmente grampeados receberam, pelo menos, cinco ligações de pessoas que não eram objeto de investigação (número extremamente baixo), tem-se mais de dois milhões de pessoas que tiveram suas conversas escutadas pela Polícia brasileira. Ou seja, no mínimo, dez por cento (10%) do total de usuários de aparelhos celulares existentes no Brasil tiveram suas conversas devassadas pela sanha investigativa.

O desafio é como interpretar e compreender tais dados. O que significam?

Quanto às escutas, entendo que faliu o sistema investigativo policial brasileiro – sem escutas não fazem mais nada – bem como, sucumbiu o judiciário ao discurso utilitarista de que os fins justificam os meios. A Constituição estabelece como garantia fundamental o direito à intimidade e excepciona a quebra do sigilo. Qual a razão de tal previsão se a regra tornou-se a interceptação? Por que tanta hipocrisia?

Mais danoso a uma sociedade é a falsa liberdade do que a transparente ditadura, pois na primeira somos ludibriados em nossas esperanças, enquanto que na segunda, ao menos, não perdemos tempo sonhando.

domingo, fevereiro 17, 2008

Infantilizados ou Do hábito de chorar


Há tempos vivo com uma inquietação que, em determinados momentos, aflora. Uma terrível acomodação toma espaço cada vez maior no cotidiano. Vivemos em um ciclo vicioso onde as pessoas são infantilizadas pelo Estado ao buscar regular, exaustivamente, as condutas sociais. Os indivíduos, diante de tal situação, acomodam-se esperando que a “mãe-estado” estenda-lhes mais uma vez a mão para afagar-lhes a cabeça e protegê-los das condutas que “ameaçam” suas brincadeiras no parque de diversões da vida.

Se as pessoas deixaram de acreditar em si próprias e o legislativo passou a querer regular tudo diante de tal inércia, ou se o abuso legislativo levou as pessoas a um estado de total passividade, quase catatônico, ainda não consegui identificar, mas o que percebo é que a cada dia que passa mais me sinto infantilizado. Um menino que é levado pela mão, pela “mãe-estado”, a fim de que a sua vida seja a mais segura. Mesmo que eu dispense o interesse por segurança. O que seria um direito meu.

O excesso de normas leva à destruição da percepção do sujeito como capaz de exercer papel de mudança nos rumos da sociedade. O fetiche da lei inebria de uma sensação quase sexual legisladores e intérpretes, ávidos pela nova regulamentação que os levam ao quase-orgasmo apenas por pensarem que, a partir de então, a salvação de nossa sociedade está garantida.

Cada vez mais temos condutas proibidas dentro de uma sociedade caracterizada pelo risco proveniente da complexidade das novas relações sociais, comerciais e profissionais que se impõem no início do século XXI. Deixamos de acreditar nas pessoas. Pasteurizou-se o sujeito para que ele não fosse capaz de sentir e emitir odores. Lobotomizou-se socialmente as pessoas. Não se reconhece ninguém como efetivamente, axiologicamente, capaz. Parte-se do pressuposto de que as pessoas não possuem capacidade de pensar.

Assim, os “lobotomizados-pasteurizados” passam a, sem perceber, acreditar nisso e a desempenharem o seu papel (ou seria apenas uma participação???) social de forma a não pensar. O cérebro passa a ser considerado apenas como algo necessário para fazer peso à cabeça e evitar que ela tombe incessantemente para um dos lados de nossos pescoços.

Com isso, já que o Estado regula tudo, o indivíduo não se vê mais compelido a pensar o que seria melhor para a sua vida e a dos demais. Quais as suas pequenas atitudes que interferem ou não na vida dos outros. Chega-se à absurda e atrofiada lógica: tudo o que não é proibido é permitido. E a cortesia fenece.

Aí, como é impossível regular-se a vida integralmente – graças à Deus, ou a quem quer que se acredite, diga-se de passagem – inevitavelmente, surgem conflitos sociais cada vez mais fúteis e que, pela inaptidão das pessoas em viver em sociedade sem a coleira ou a mão do Estado, podem ter conseqüências graves.

Hoje, diante do absurdo número de mortos no trânsito se fala em leis bem mais severas, tanto no âmbito do direito penal, como na esfera administrativa. Ou então, para evitar qualquer espécie de delito proíbe-se a comercialização de bebidas alcoólicas após um determinado horário. Proíbe-se, também, de fumar em quase todos os locais habitáveis.

Nunca causei vítimas ao dirigir meu automóvel, nunca briguei após ingerir bebidas alcoólicas e não fumo – salvo umas cachimbadas no final de semana, escondido para não ser apedrejado.

Não se trata de entrar no mérito da questão se tais medidas são adequadas ou não, apenas servem de exemplo. O que pretendo trazer à reflexão é o quanto somos oprimidos por novas leis; um número cada vez mais sufocante que nos leva à acomodação, ao não fazer nada como seres humanos no sentido de alterar as nossas relações com os outros.

A nossa inaptidão para desenvolver relações pessoais saudáveis, mesmo que, por um milagre legal, deixem de figurar no campo do trânsito, da embriaguez ou do tabaco, será transferida para outra esfera de crise e nós, infantilizados, sentaremos na calçada e choraremos até o momento em que a mãe-estado sinalize com a solução, quando, na verdade, estará agravando o problema. Ficaremos cada vez mais mimados e ensimesmados, alheios a um próximo cada vez mais distante.

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quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Celebração da Vida ou Um café com Zaratustra

Viver de forma a querer a mesma vida sempre. É o desafio que se impõe.

A celebração da vida e o entusiasmo em usufruí-la exigem o questionamento acima. Imagine-se sentado sobre o seu próprio caixão observando as pessoas chegarem para dar simbolicamente o último “olá” ou, melhor, o verdadeiro “adeus”, e descortinando-se duas opções: a eternidade do espírito (caso, de fato, exista) ou recomeçar a viver.

Certamente, a partir do medo do inexorável, a morte – paradoxalmente a única certeza da vida – optar-se-ia por viver de novo. Contudo, quando hipoteticamente dá-se tal opção (viver de novo), geralmente, sente-se o desejo de consertar o passado, corrigir os erros, não realizar determinados atos ou de tomar decisões em momentos que escaparam por entre os dedos.

Não seria tão fácil. O desfio que se impõe é se cada um de nós estaria disposto a repetir. Isso! Reprisar, na íntegra, o roteiro de sua vida, sem alterações, com os mesmos equívocos, acertos, vitórias, derrotas, ações e omissões. Os mesmos cavalos encilhados que deixamos passar continuarão passando. As mesmas barcas furadas que tripulamos afundarão. O doce, o amargo e o azedo de nossa caminhada. As oportunidades perdidas serão novamente postas à nossa mesa e tomaremos a decisão errada; atos de bravura e covardia, todos idênticos. Dores, alegrias... tudo igual. Ou seja, verificar se morremos na hora certa.

Morrer na hora certa significa viver o melhor possível para só então morrer. Não deixar nada por viver e querer a mesma vida para sempre. Repetir nossas angústias com a certeza de que ao final teremos curtido cada momento de dor até alcançar o sentimento de sua superação e a conseqüente sensação ímpar de bem estar. Termos as mesmas recompensas mais uma vez.

Intensificar a vida talvez seja a mensagem que se pretende passar. Olhar o futuro, breve ou longínquo, e ter perspectivas, sonhar... mirar o relógio como mais um detalhe que apenas nos afasta temporariamente do que realmente queremos e optamos, pois efetivamente vale a pena e vamos alcançar, ou, ao menos, termos a certeza de que fizemos o possível e fazer o possível é sempre algo a nos preencher de sentido.

Não deixe nada por viver. Celebre a vida ou tome um café com Zaratustra e faça a sua leitura.

terça-feira, janeiro 29, 2008

Urbanismo e Segurança ou Descaso e Mortes


A insegurança pública se constitui em um dos maiores temores da sociedade brasileira. Seja real ou apenas aparente, aproximada da nossa realidade pela velocidade dos meios de comunicação e pelo discurso simbólico, reflete, inegavelmente, o medo. “Medo” que Paul Virilio, em Velocidade e Política, descreveu como o mais cruel dos assassinos, pois não mata jamais, mas impede de viver.

É certo que o aumento da criminalidade possui relações indissociáveis com a desigualdade, com a desestruturação do indivíduo, com a falta de perspectivas, etc.

Segurança passa por uma sociedade menos desigual, talvez menos digital, mas passa também por urbanismo.

Por mais estranho que pareça ao tema, essa esquisitice é meramente aparente. Apenas entre os anos de 1999 e 2001 o número de favelas no Brasil cresceu 150%, o Brasil possui um déficit habitacional de 7,2 milhões de moradias, o que representa 32 milhões de pessoas sem um lugar decente para viver. Sem lar.

O tal dívida é reflexo da ausência de políticas habitacionais de médio e longo prazos e da falta de preocupação com a organização do espaço urbano, em especial a ocupação do solo. O descuido nestas áreas, somados ao conforto político da manutenção da situação como ela está geram a favelização.

A favelização, em geral, dá-se verticalmente, em morros e encostas das grandes cidades. Em sua estrutura “urbanística” é formada por vielas, por barracos construídos sobre barracos, por passagens ocultas, por becos, enfim, um labirinto de madeira e cimento, capaz de dar inveja a Dédalus.

Ambiente em que o poder público, historicamente ausente, se vê, voluntariamente ou não, incapacitado de adentrar e cumprir as políticas públicas que a Constituição obriga. A disposição urbana das favelas facilita a ocultação, a prática de crimes e violências, física e psicológica, em que as vítimas são, na maioria das vezes, os que lá residem. Jogados ao morro e esquecidos aos que lá mandam.

O poder público, ciente de sua inoperância e diante da falta de preocupação com a organização efetiva do espaço urbano, acreditando que com o andar da carroça as melancias se ajeitam, fecha os olhos à ocupação desregrada. E só se recorda da situação precária em que vivem quando ocorre um desabamento ou quando traficantes se aproveitam do labirinto para organizar sua atividade e espalhar medo pelo asfalto que fica logo abaixo do morro.

Enquanto isso, a capacidade de resposta do poder público desaparece e a degradação ambiental, que antes era a desculpa para não licenciar o loteamento, já está feita.

O planejamento urbano se constitui política pública da mais alta importância. O Estado não dispõe de meios para impossibilitar a ocupação desregrada. Na Europa, os castelos e mansões localizam-se nas encostas dos morros, locais nobres. No Brasil, por serem imaculáveis pela ocupação lícita e por não haver uma política habitacional efetiva aos desprovidos, são ocupados por quem não tem onde morar.

Resultado: danos ambientais, desabamentos, mortes e ausência do Estado a quem mais necessita, os subjugados pela força e pelo medo.

quarta-feira, janeiro 23, 2008

Desafiando o conforto ou Vivendo os sonhos


O olhar da criança ao arriscar os primeiros passos é fixo em algum ponto do chão, mais à frente. Desviá-lo pode ser fatal para a continuidade de seu caminho; cair talvez seja o destino inexorável. Ela cai, senta, olha perdidamente em uma busca de auxílio, mas, em seguida, reinicia a sua tentativa, só... levanta-se instável, equilibra-se e vai em frente. Logo, logo, estará correndo, esquecendo-se, para sempre, da dificuldade que tivera nos primeiros passos.

A criança desafia o conforto do colo dos pais para desbravar o desconhecido. A sede por conhecer, tocar o novo e saborear a vida retira-a da posição de espectadora. Instintivamente, procura saciar a sua fome de viver.

À noite, enquanto dorme, sorri. Será que em seus sonhos ela caminha? Corre? Flutua? Quem sabe? Inegavelmente, contudo, as crianças são desbravadoras, conquistadoras de um mundo que se coloca à sua frente e, ignorando o conforto, lutam para viver os seus sonhos.

Nós, adultos, embasbacados diante da graça que apresentam fechamos os olhos para isso e deixamos de aprender com eles. Sim, pois, não raro, renunciamos aos nossos sonhos em nome do conforto, daquilo que chamamos de estabilidade – seja emocional, financeira, laboral...

A questão é o quão doloroso, ou melhor, danoso para nós mesmos, é esta renúncia. Quantas vezes as oportunidades passam e restamos parados, sentados à janela, assumindo a posição passiva de espectadores. Quantos momentos desafiadores, instigantes e cálidos atravessam nosso caminho e deixamos de assumir a posição à qual nos difere na coletividade, a de protagonistas, perdendo experiências – talvez o maior bem do ser humano. Experiência que não se confunde com idade, mas com situações vividas. Situações estas que enriquecem o indivíduo e o torna fascinante.

Dentre as várias características, classificações ou rótulos que se atribuam ao sujeito temos os “espectadores” – acomodados com a situação de vida que enfrentam – e os “protagonistas” – inquietos irrequietos que insistem em sempre buscar algo mais. Em enfrentar e superar vários desafios, muito embora tais desafios possam trazer “quedas” e algumas dores. Contudo, o horizonte descortina-se diariamente às suas frentes e, ao menos ao meu gosto, transformam as suas vidas em algo bem mais saboroso.

Inegável que cada um de nós, independentemente de nossas características mais marcantes, passa por momentos mais “espectadores” e outros mais “protagonistas”, afinal, felizmente, não somos pessoas acabadas ou concluídas, mas em permanente mutação, aprimoramento ou perecimento.

Contudo, apesar de tais momentos, a permanente manutenção e busca de atitudes protagonistas nos coloca do lado mais saboroso da vida, às vezes amargo, mas, fundamentalmente, o mais importante, mantém vivo o paladar da vida, a desafiar o conforto e a viver os sonhos.

domingo, janeiro 13, 2008

Entre lágrimas e despedidas ou Da arte de arrumar malas


Mudança: troca, substituição, alteração, modificação, permuta, inovação, transferência, deslocamento, afastamento...

Palavra ambígua. Divide nosso coração ao meio, entre a euforia incontida e a profunda melancolia. Complicado. Montanha-russa de sensações, maníaca e depressiva, uma espécie de transtorno bipolar com data marcada.

Sofreguidão.

A vontade de deparar-se com o novo ou de retornar ao seio antigo, à estabilidade das relações, ao carinho e afago priscos, longínquos, talvez o nosso mais remoto traço da memória; desatormentar o sentido. Viver mais leve, se é que o peso não é nossa idiossincrasia que nos é apenas característica sermos o que somos, o que sonhamos, o que tememos, o que nos ilumina e destrói.

Na saída são abraços, risos, lágrimas, calafrios, malas, roupas, sapatos, livros, muitos, beijos, olhos carregados, lágrimas que não se permitem suicidar e que embaçam o penhasco da íris. Sonhos abertos, novos sonhos... novos tempos.

Na chegada, o mesmo. Curioso, mas exatamente o mesmo. Alegremente o mesmo.

Vai-se, mas não se abre mão de nada que ficou para trás, ou melhor... Nada ficou para trás!! Apenas não se está mais junto diariamente, mas se carrega no peito, na memória permanentemente presente e nas facilidades das novas tecnologias.

Tal qual antes... apenas um pouco mais remoto.

terça-feira, janeiro 08, 2008

Entre afagos e suspiros ou A versão tropical de “Dos en la ciudad”.

Entre o último disparo do sol escaldante e o primeiro estampido da noite, quase que por casualidade, eles se encontram na praia. Um doce sorriso cúmplice nos lábios. O gélido arrepio da apreensão do encontro situado no poço fundo do estômago. Olham-se, riem e sentam-se na areia.

Há tempo não se viam, ao menos não com a possibilidade de conversar sem estarem premidos pelo tempo, pelas pessoas, pelos compromissos. Aquela noite era só deles. Tal percepção transformava um pequeno em um largo e brilhante sorriso que refletia nas estrelas.

Logo abriram suas bocas e a conversa fluía solta, leve, inebriando-os lenta e vagarosamente, intimamente... o diálogo os entorpecia, tornado supérfluos o vinho e o fumo.

O tempo passou, horas... doces horas. Aliás, parecia não haver tempo, entorno, espaço, eram os dois, sós, apenas os dois na cidade. Nada mais em volta, unicamente suas vozes e o calor da pele de cada um que, aos poucos, se sentia. Encostavam-se em meio à fala e a mão de um repousava carinhosamente no braço do outro. Dedos entrelaçavam-se.

Ela falava mais, gesticulava mais. Ele, encantado, ria e a adorava. Ela perguntava como e quando havia decidido partir, se tiveras filhos e se era feliz. Ele, se ela estava sozinha, e, Ela, sim, que sabia fingir...

A noite passou e quando perceberam, nada mais, nenhuma luz além da lua iluminava a praia, todos dormiam. Dormiram ali. Entre abraços, afagos, carícias, cheiros, mas, curiosamente, sem beijos...

Ao primeiro raio de sol foram para casa. Dele ou dela... tanto faz... e proibiram-se mutuamente de de lá sair. Ficaram o final de semana. Sim, com beijos. Muitos. Sumiram. Desapareceram para o mundo e seus telefones celulares ao perceberem a magia do momento, decidiram, espontaneamente, parar de tocar. Silêncio. Ou quase isso.

Na segunda-feira, quando ele acordou, percebeu que ela já não mais estava ali... mas sorriu. Naqueles dois dias, foram só eles e mais ninguém, apenas dos en la ciudad.