O olhar da criança ao arriscar os primeiros passos é fixo em algum ponto do chão, mais à frente. Desviá-lo pode ser fatal para a continuidade de seu caminho; cair talvez seja o destino inexorável. Ela cai, senta, olha perdidamente em uma busca de auxílio, mas, em seguida, reinicia a sua tentativa, só... levanta-se instável, equilibra-se e vai em frente. Logo, logo, estará correndo, esquecendo-se, para sempre, da dificuldade que tivera nos primeiros passos.
A criança desafia o conforto do colo dos pais para desbravar o desconhecido. A sede por conhecer, tocar o novo e saborear a vida retira-a da posição de espectadora. Instintivamente, procura saciar a sua fome de viver.
À noite, enquanto dorme, sorri. Será que em seus sonhos ela caminha? Corre? Flutua? Quem sabe? Inegavelmente, contudo, as crianças são desbravadoras, conquistadoras de um mundo que se coloca à sua frente e, ignorando o conforto, lutam para viver os seus sonhos.
Nós, adultos, embasbacados diante da graça que apresentam fechamos os olhos para isso e deixamos de aprender com eles. Sim, pois, não raro, renunciamos aos nossos sonhos em nome do conforto, daquilo que chamamos de estabilidade – seja emocional, financeira, laboral...
A questão é o quão doloroso, ou melhor, danoso para nós mesmos, é esta renúncia. Quantas vezes as oportunidades passam e restamos parados, sentados à janela, assumindo a posição passiva de espectadores. Quantos momentos desafiadores, instigantes e cálidos atravessam nosso caminho e deixamos de assumir a posição à qual nos difere na coletividade, a de protagonistas, perdendo experiências – talvez o maior bem do ser humano. Experiência que não se confunde com idade, mas com situações vividas. Situações estas que enriquecem o indivíduo e o torna fascinante.
Dentre as várias características, classificações ou rótulos que se atribuam ao sujeito temos os “espectadores” – acomodados com a situação de vida que enfrentam – e os “protagonistas” – inquietos irrequietos que insistem em sempre buscar algo mais. Em enfrentar e superar vários desafios, muito embora tais desafios possam trazer “quedas” e algumas dores. Contudo, o horizonte descortina-se diariamente às suas frentes e, ao menos ao meu gosto, transformam as suas vidas em algo bem mais saboroso.
Inegável que cada um de nós, independentemente de nossas características mais marcantes, passa por momentos mais “espectadores” e outros mais “protagonistas”, afinal, felizmente, não somos pessoas acabadas ou concluídas, mas em permanente mutação, aprimoramento ou perecimento.
Contudo, apesar de tais momentos, a permanente manutenção e busca de atitudes protagonistas nos coloca do lado mais saboroso da vida, às vezes amargo, mas, fundamentalmente, o mais importante, mantém vivo o paladar da vida, a desafiar o conforto e a viver os sonhos.
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